Poeta: Augusto dos Anjos

Augusto dos Anjos era considerado um dos poetas brasileiros mais críticos de sua época. Augusto é tido como o mais importante poeta do pré-modernismo, embora revele em suas poesias raízes do simbolismo. Retratou o gosto pela a angústia, a morte e fez uso constante de metáforas. Foi nomeado para o cargo de professor, em 1908, mas em 1910, foi afastado da função por desentendimentos com superiores.

Neste mesmo ano casou-se com Ester Fialho e mudou-se para o Rio de Janeiro. Já no Rio de Janeiro, Augusto dos Anjos lecionou literatura em diversas instituições de ensino. Foi nomeado professor de Geografia, em 1911, e durante esse período, publicou vários poemas em jornais e revistas da época. Embora contemporâneo a geração simbolista, Augusto dos Anjos permaneceu à margem do estilo literário. Sua obra apresenta, na verdade, uma experiência única: a união do cientificismo naturalista com o Simbolismo. Por esse motivo, dado o caráter sincrético de sua poesia, o autor é categorizado como parte do grupo Pré-modernista.

Sua poesia anti-lírica, iniciou debates sobre os conceitos de “boa poesia” e preparou o terreno para a grande renovação modernista. Augusto dos Anjos, em 1912, publicou seu único livro intitulado “EU”. O livro com 58 poemas, chocou os críticos pela agressividade do vocabulário e por sua obsessão pela morte, sua única obra foi reeditada, em 1919, e chamada de: “Eu e Outras Poesias”.

Vandalismo – Augusto dos Anjos

Meu coração tem catedrais imensas,Templos de priscas e longínquas datas,Onde um nume de amor, em serenatas,Canta a aleluia virginal das crenças. Na ogiva fúlgida e nas colunatasVertem lustrais irradiações intensas,Cintilações de lâmpadas suspensas,E as ametistas e os florões e as pratas. Como os velhos Templários medievais,Entrei um dia nessas catedraisE nesses templos claros e risonhos… …

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Versos íntimos – Augusto dos Anjos

Vês?! Ninguém assistiu ao formidávelEnterro de tua última quimera.Somente a Ingratidão — esta pantera —Foi tua companheira inseparável! Acostuma-te à lama que te espera!O Homem, que, nesta terra miserável,Mora, entre feras, sente inevitávelNecessidade de também ser fera. Toma um fósforo. Acende teu cigarro!O beijo, amigo, é a véspera do escarro,A mão que afaga é a …

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Volúpia imortal – Augusto dos Anjos

Cuidas que o genesíaco prazer,Fome do átomo e eurítmico transporteDe todas as moléculas, aborteNa hora em que a nossa carne apodrecer?! Não! Essa luz radial, em que arde o Ser,Para a perpetuação da Espécie forte,Tragicamente, ainda depois da morte,Dentro dos ossos, continua a arder! Surdos destarte a apóstrofes e brados,Os nossos esqueletos descamados,Em convulsivas contorções …

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Vozes da morte – Augusto dos Anjos

Agora, sim! Vamos morrer, reunidos,Tamarindo de minha desventura,Tu, com o envelhecimento da nervuraEu, com o envelhecimento dos tecidos! Ah! Esta noite é a noite dos Vencidos!E a podridão, meu velho! E essa futuraUltrafatalidade de ossatura,A que nos acharemos reduzidos! Não morrerão, porém tuas sementes!E assim, para o Futuro, em diferentesFlorestas, vales, selvas, glebas, trilhos, Na …

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Primavera – Augusto dos Anjos

Arte ingrata! E conquanto, em desalento,A órbita elipsoidal dos olhos lhe arda,Busca exteriorizar o pensamentoQue em suas fronetais células guarda! Tarda-lhe a Idéia! A inspiração lhe tarda!E ei-lo a tremer, rasga o papel, violento,Como o soldado que rasgou a fardaNo desespero do último momento! Tenta chorar, e os olhos sente enxutos!…É como paralítico que, à …

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Caixão fantástico – Augusto dos Anjos

Célere ia o caixão, e, nele, inclusas,Cinzas, caixas cranianas, cartilagensOriundas, como os sonhos dos selvagens,De aberratórias abstrações abstrusas! Nesse caixão iam talvez as Musas ,Talvez meu Pai! Hoffmânnicas visagensEnchiam meu encéfalo de imagensAs mais contraditórias e confusas! A energia monística do Mundo,À meia-noite, penetrava fundoNo meu fenomenal cérebro cheio … Era tarde ! Fazia muito …

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A idéia – Augusto dos Anjos

De onde ela vem?! De que matéria brutaVem essa luz que, sobre as nebulosas,Cai de incógnitas criptas misteriosasComo as estalactites duma gruta?! Vem da psicogenética e alta lutaDo feixe de moléculas nervosas,Que, em desintegrações maravilhosas,Delibera, e, depois, quer e executa! Vem do encéfalo absconso que a constringe,Chega em seguida às cordas do laringe,Tísica, tênue, mínima, …

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A louca – Augusto dos Anjos

A Dias Paredes Quando ela passa: – a veste desgrenhada,O cabelo revolto em desalinho,No seu olhar feroz eu adivinhoO mistério da dor que a traz penada. Moça, tão moça e já desventurada;Da desdita ferida pelo espinho,Vai morta em vida assim pelo caminho,No sudário de mágoa sepultada. Eu sei a sua história. – Em seu passadoHouve …

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A noite – Augusto dos Anjos

A nebulosidade ameaçadoraTolda o éter, mancha a gleba, agride os riosE urde amplas teias de carvões sombriosNo ar que alacre e radiante, há instante, fora. A água transubstancia-se. A onda estouraNa negridão do oceano e entre os naviosTroa bárbara zoada de ais bravios,Extraordinariamente atordoadora. À custódia do anímico registroA planetária escuridão se anexa…Somente, iguais a …

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Alucinação a beira mar – Augusto dos Anjos

Um medo de morrer meus pés esfriava.Noite alta. Ante o telúrico recorte,Na diuturna discórdia, a equórea coorteAtordoadoramente ribombava! Eu, ególatra céptico, cismavaEm meu destino!… O vento estava forteE aquela matemática da MorteCom os seus números negros me assombrava! Mas a alga usufructuária dos oceanosE os malacopterígios subraquianosQue um castigo de espécie emudeceu, No eterno horror …

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Idealismo – Augusto dos Anjos

Falas de amor, e eu ouço tudo e calo!O amor da Humanidade é uma mentira.É. E é por isto que na minha liraDe amores fúteis poucas vezes falo. O amor! Quando virei por fim a amá-lo?!Quando, se o amor que a Humanidade inspiraÉ o amor do sibarita e da hetaíra,De Messalina e de Sardanapalo?! Pois …

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Anseio – Augusto dos Anjos

Que sou eu, neste ergástulo das vidasDanadamente, a soluçar de dor?!– Trinta triliões de células vencidas,Nutrindo uma efeméride inferior. Branda, entanto, a afagar tantas feridas,A áurea mão taumitúrgica do AmorTraça, nas minhas formas carcomidas,A estrutura de um mundo superior! Alta noite, esse mundo incoerenteEssa elementaríssima sementeDo que hei de ser, tenta transpor o Ideal… Grita …

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Infeliz – Augusto dos Anjos

Alma viúva das paixões da vida,Tu que, na estrada da existência em fora,Cantaste e riste, e na existência agoraTriste soluças a ilusão perdida; Oh! Tu, que na grinalda emurchecidaDe teu passado de felicidadeFoste juntar os goivos da SaudadeÀs flores da Esperança enlanguescida; Se nada te aniquila o desalentoQue te invade, e o pesar negro e …

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Ao luar – Augusto dos Anjos

Quando, à noite, o Infinito se levantaA luz do luar, pelos caminhos quedosMinha táctil intensidade é tantaQue eu sinto a alma do Cosmos nos meus dedos! Quebro a custódia dos sentidos tredosE a minha mão, dona, por fim, de quantaGrandeza o Orbe estrangula em seus segredos,Todas as coisas íntimas suplanta! Penetro, agarro, ausculto, apreendo, invado,Nos …

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O Deus verme – Augusto dos Anjos

Fator universal do transformismo.Filho da teleológica matéria,Na superabundância ou na miséria,Verme – é o seu nome obscuro de batismo. Jamais emprega o acérrimo exorcismoEm sua diária ocupação funérea,E vive em contubérnio com a bactéria,Livre das roupas do antropomorfismo. Almoça a podridão das drupas agras,Janta hidrópicos, rói vísceras magrasE dos defuntos novos incha a mão… Ah! …

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Apocalipse – Augusto dos Anjos

Minha divinatória Arte ultrapassaos séculos efêmeros e notaDiminuição dinâmica, derrotaNa atual força, integérrima, da Massa. É a subversão universal que ameaçaA Natureza, e, em noite aziaga e ignota,Destrói a ebulição que a água alvorotaE põe todos os astros na desgraça! São despedaçamentos, derrubadas,Federações sidéricas quebradas…E eu só, o último a ser, pelo orbe adeante, Espião …

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O lupanar – Augusto dos Anjos

Ah! Por que monstruosíssimo motivoPrenderam para sempre, nesta rede,Dentro do ângulo diedro da parede,A alma do homem polígamo e lascivo?!Este lugar, moços do mundo, vêde:É o grande bebedouro colectivo,Onde os bandalhos, como um gado vivo,Todas as noites, vêm matar a sede!É o afrodístico leito do hetairismo,A antecâmara lúbrica do abismo,Em que é mister que o …

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Budismo moderno – Augusto dos Anjos

Tome, Dr., esta tesoura, e… corteMinha singularíssima pessoa.Que importa a mim que a bicharia roaTodo o meu coração, depois da morte?! Ah! Um urubu pousou na minha sorte!Também, das diatomáceas da lagoaA criptógama cápsula se esbroaAo contacto de bronca dextra forte! Dissolva-se, portanto, minha vidaIgualmente a uma célula caídaNa aberração de um óvulo infecundo; Mas …

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A fome e o amor a um monstro fome – Augusto dos Anjos

E, na ânsia voraz que, ávida, aumenta,Receando outras mandíbulas a esbangem,Os dentes antropófagos que rangem,Antes da refeição sanguinolenta! Amor! E a satiríasis sedenta,Rugindo, enquanto as almas se confrangem,Todas as danações sexuais que abrangemA apolínica besta famulenta! Ambos assim, tragando a ambiência vasta,No desembestamento que os arrasta,Superexcitadíssimos, os dois Representam, no ardor dos seus assomosA alegoria …

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A caridade – Augusto dos Anjos

No universo a caridadeEm contraste ao vicio infandoÉ como um astro brilhandoSobre a dor da humanidade! Nos mais sombrios horroresPor entre a mágoa nefastaA caridade se arrastaToda coberta de flores! Semeadora de carinhosEla abre todas as portasE no horror das horas mortasVem beijar os pobrezinhos. Torna as tormentas mais calmasOuve o soluço do mundoE dentro …

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