Autor: Maria Firmina dos Reis
(À minha querida irmã – Amália Augusta dos Reis)
Vejamos pois esta deserta praia, Que a meiga lua a pratear começa, Com seu silêncio se harmoniza esta alma, Que verga ao peso de uma sorte avessa. Oh! meditemos na soidão da terra, Nas vastas ribas deste imenso mar; Ao som do vento, que sussurra triste, Por entre os leques do gentil palmar. O sol nas trevas se envolveu, – mistérios Encerra a noite, – ela compr’ende a dor; Talvez o manto, que estendeu no bosque, Encubra um peito que gemeu de amor. E o mar na praia como liso ondeia, gemendo triste, sem furor – com mágoas… Também meditas, oh! salgado pego – Também partilhas desta vida as frágoas?… E a branca lua a divagar no céu, Como uma virgem nas soidões da terra; Que doce encanto tem seu meigo aspecto, E tanto enlevo sua tristeza encerra! Sim, meditemos… quem gemeu no bosque, Onde a florzinha a perfumar cativa? Seria o vento? Ele passando ergueu Do tronco a copa sobranceira, altiva. Passou. E agora sufocando a custo Meu peito o doce palpitar do amor, Delícias bebe desterrando o susto, Que a noite incute a semear pavor. E um deleite inda melhor que a vida, langor, quebranto, ou sofrimento ou dor; Um quê de afetos meditando eu sinto, Na erma noite, a me exaltar de amor. Então a mente a divagar começa, Criando afouta seu sonhado amor; Zombando altiva de uma sorte avessa, Que oprime a vida com fatal rigor. E nessa hora a gotejar meu pranto, Nas ermas ribas de saudoso mar, Vagando a mente nesse doce encanto, Dá vida ao ente, que criei p’ra amar. E a doce imagem vaporosa, e bela, Que a mente erguera, engrinaldou de amor, Ergue-se vaga, melindrosa, e grata Como fragrância de mimosa flor. E o peito a envolve de extremoso afeto, E dá-lhe a vida, que lhe dera Deus; Ergue-lhe altares – lhe engrinalda a fronte, Rende-lhe cultos, que só dera aos céus. Colhe p’ra ela das roseiras belas, Que aí cultiva – a mais singela flor: E num suspiro vai depor-lhe as plantas, Como oferenda – seu mimoso amor. Mas, ah! somente a duração dum ai Tem esse breve devanear da mente. Volve-se a vida, que é só pranto, e dor, E cessa o encanto do amoroso ente. |
[ CANTOS À BEIRA MAR, São Luís do Maranhão, 1871, pags. 173-175 ]
Maria Firmina dos Reis