Autor: Maria Firmina dos Reis
Donzela, tu suspiras – esse pranto, Que vem do coração banhar teu rosto, Esse gemer de lânguido penar, Revela amarga dor – imo desgosto: Amiga… acaso cismas ao luar, Terno segredo de ignoto amor?!… Soltas madeixas desprendidas voam Por sobre os ombros de nevada alvura; Tua fronte pálida os pesares c’roam Como auréola de martírio… pura, Cândida virgem… que abandono o teu? Sonhas acaso com o viver do céu! Sentes saudades da morada d’anjos, D’onde emanaste? enlangueces, gemes? É nostalgia o teu sofrer? de arcanjos Perder o afeto que te votam – temes? Ou temes, virgem – de perder na terra, Toda a pureza que tu’alma encerra!?… Não, minha amiga – que a pureza tua Jamais o mundo poderá manchar: Límpida vaga a melindrosa lua, Vencendo a nuvem, que se esvai no ar, E mais amena, mais gentil, e grata Despede às águas refulgir de prata. Que cismas pois? porque suspiras, virgem? Porque divagas solitária, e triste? Delira a flor – e na voraz vertigem Dum louco afeto, té morrer persiste… Pálida flor! o teu perfume exalas Nesses suspiros, que equivalem falas. Cismas à noite… que cismar o teu? Sonhas acaso misterioso amor? Vês nos teus sonhos o que encerra o céu? Aspiras d’anjos o fragrante olor!? Porque, não creio que a esta terra impura Prendas tua alma, divinal feitura. Não. É resumo dos afetos santos Que além se gozam – que uma vez somente À terra descem, semelhando prantos. Que chora a aurora sobre a flor olente: Meigos, sem mancha, vaporosos, ledos, Puros, – de arcanjos divinais segredos. Sentes saudades da morada d’anjos! Sentes saudade do viver dos céus? Ouves os carmes de gentis arcanjos! Soluças n’harpa teu louvor a Deus!… Anjo! descanta sobre a terra impia Místicas notas de eternal poesia. |
[ CANTOS À BEIRA MAR, São Luís do Maranhão, 1871, pags. 169-171 ]
Maria Firmina dos Reis