Análise de Letras

Talento e formosura

Tu podes bem guardar os dons da formosura

Que o tempo, um dia, há de implacável trucidar

Tu podes bem viver ufana da ventura

Que a natureza, cegamente, quis te dar


Prossegue embora em flóreas sendas sempre ovante

De glórias cheia no teu sólio triunfante

Que antes que a morte vibre em ti funéreo golpe seu

A natureza irá roubando o que te deu


E quanto a mim, irei cantando o meu ideal de amor

Que é sempre novo no viçor da primavera

Na lira austera em que o Senhor me fez tão destro

Será meu estro só do que for imortal


Terei mais glória em conquistar com sentimento

Pensantes almas de valor e alto saber

E com amor e com pujança de talento

Fazer um bargo ternas lágrimas verter


Isto é mais nobre é mais sublime e edificante

Do que vencer um coração ignorante

Porque a beleza é só matéria e nada mais traduz

Mas o talento é só o espirito e só luz


Descantarei na minha lira as obras-primas do Criador

Uma color da flor desabrochando à luz do luar

O incenso d'água que nos olhos faz a mágoa rutilar

Uns olhos onde o amor tem seu altar


E o verde mar que se debruça n'alva areia a espumejar

E a noite que soluça e faz a lua soluçar

E a estrela d'alva e a estrela Vésper languescente

Bastam somente para os bardos inspirar


Mas quando a morte conduzir-te à sepultura

O teu supremo orgulho em pó reduzirá

E após a morte profanar-te a formosura

Dos teus encantos mais ninguém se lembrará


Mas quando Deus fechar meus olhos sonhadores

Serei lembrado pelos bardos trovadores

Que os versos meus hão de na lira em magos tons gemer

E eu, morto embora, nas canções hei de viver

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