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Noite cheia de estrelas

Noite alta, céu risonho
E a quietude é quase um sonho
O luar cai sobre a mata
Qual uma chuva de prata
De raríssimo esplendor
Só tu dormes e não escutas
O teu cantor
Revelando à Lua airosa
A história dolorosa desse amor

Lua
Manda a tua luz prateada
Despertar a minha amada
Quero matar meus desejos
Sufocá-la com os meus beijos

Canto
E a mulher que amo tanto
Não me escuta, está dormindo
Canto e por fim
Nem a Lua tem pena de mim
Pois ao ver que quem te chama sou eu
Entre a neblina se escondeu
Lá no alto a Lua esquiva
Está no céu tão pensativa
E as estrelas tão serenas
Qual dilúvio de falenas
Andam tontas ao luar
Todo o astral ficou silente
Para escutar
O teu nome entre as endechas
A dolorosas queixas
Ao luar

Nênias

Murcharam no jardim os crisântemos,
As magnólias se despetalaram,
As rosas de perfume tão amenos
Sentindo tua ausência desmaiaram.
O vento agora passa soluçando,
As flores que morreram carregando,
O próprio vento entende a minha solidão
E a viuvez do meu dorido coração.

Aquele sabiá que na alvorada
Vinha te dar a matutina saudação,
Ao ver nossa choupana abandonada
Morreu, agonizando na garganta uma canção.
As próprias andorinhas irrequietas,
Agora têm por nosso lar grande pavor,
Fugiram as policromas borboletas
Pois não existe no jardim nem uma flor.

E qual um irerê descasalado
Contemplo o nosso ninho abandonado,
Na cristalização da minha mágoa
Meus olhos esmaecem rasos d’água.
E agora que o teu lar é um campo santo
Não ouves a agonia do meu pranto,
Ó nênias amorosas, nênias imortais!
Que compreende-las tu não podes nunca mais.

O cigano

Um dia
Eu em Andaluzia
Ouvi um cigano cantar
Havia
No cantar nostalgia
De castanholas batidas ao luar
Mas era
A canção tão sincera
Que eu a julguei para mim
E agora que a minh’alma te chora
Ouve bem a canção que era assim

O amor tem a vida da flor
Não sonhe alguém
Do seu sonho o colher
Do seu sonho o colher

Pois bem
Como acontece à flor
O lindo amor
Principia a morrer
Principia a morrer

Cigano
Que sabias o engano
Por que me fizeste tão mal?
Não fora
A canção traidora
E o meu sonho seria eternal
Quem há de
Fugir à realidade
Que vem desmentir a ilusão?
E hoje
Que teu beijo me foge
Cantarei
Do cigano, a canção!

Saudade do sertão

Lá na serra altaneira
Onde a cachoeira
Passa a murmurar
A alma se enebria
Na doce harmonia
Do branco luar
Sob um docel de estrelas
Que supõe ao vê-las
Olhos a brilhar
O coração palpita
E todo nos grita
Como é belo amar

E ao frescor tão salutar
Das madrugadas
Divina aroma sem igual bem perfumadas
Queres acaso linda moça comparar
Horror sem fim de uma cidade
A tumultuar, a tumultuar
E esse esplendor
De que se veste a primavera
Essa alegria do sertão, pura e sincera
Não tem rival na capital
Onde se abre as mãos
As multidões em vendavais, ilusões

Luar do sertão

Ah, que saudade
Do luar da minha terra
Lá na serra branquejando
Folhas secas pelo chão
Este luar cá da cidade tão escuro
Não tem aquela saudade
Do luar lá do sertão
Não há, oh! Gente, oh! Não
Luar como este do sertão
Não há, oh! Gente, oh! Não
Luar como este do sertão

A gente fria
Desta terra sem poesia
Não se importa com esta Lua
Nem faz caso do luar
Enquanto a onça
Lá na verde capoeira
Leva uma hora inteira
Vendo a Lua meditar
Não há, oh! Gente, oh! Não
Luar como este do sertão
Não há, oh! Gente, oh! Não
Luar como este do sertão

Ai quem me dera
Que eu morresse lá na serra
Abraçado à minha terra
E dormindo de uma vez
Ser enterrado numa grota pequenina
Onde à tarde a surubina
Chora a sua viuvez
Não há, oh! Gente, oh! Não
Luar como este do sertão
Não há, oh! Gente, oh! Não
Luar como este do sertão

À luz do luar

À suave e meiga luz desse luar,
Iluminando com doçura esta mansão,
Acordar vem sem querer o coração,
Que já cansado ele se achava de sonhar,
Vem depressa me escutar,
A mágoa ouvir de um coração,
Que está ferido,
Está perdido por te amar!
Vem ver este luar, o canto meu sentir,
O meu amor vibrar, o meu amor vibrar,
Com o peito irradiar,
Sentir, gozar ! Ouvir cantar,
Um’alma dolorida,
Que vive, ai, esquecida,
Meu doce amor à luz do luar,
Escuta o soluçar do teu cantor,
O meu canto vem ouvir, ó minha flor!
Banhado está teu lindo rosto no luar,
Atende este soluçar do teu cantor
Que faz brilhantes,
Dá-te a luz do teu olhar,
Vem solícita escutar,
Amada ouvir o teu cantor,
Que está ferido,

Está perdido por te amar!
Olha bem este luar,
Repara o meu sofrer,
Que cresce pra te amar,
Eu só quero te ver….

A vida é um jardim onde as mulheres são as flores

Ao ver o céu estrelas sem sapato
Ouvindo o mar tão belo tão profundo
Suponho ver num astro debruçado
Deus me apotento jóias deste mundo
Além aponte triste romoreica
Cortando os ares cruzam passarinhos
Porém minh’alma que também dardeja
Enveredou feliz noutros caminhos

Deus por certo bem conhece
Uma jóia que floresce
Sem a luz do sol sequer
Sim eu juro com firmeza
Que o tesouro com certeza
Só no peito da mulher

Minh’alma segue triste na jornada
Pois necessita como quê sonhando
Gotas de luz que ficam pela estrada
Parecem flores pelo chão brotando
Precisa que a gente chama a vida
Sou jardineiro certo trovadores
Por onde o peito a jarra preferida
Onde as mulheres são mimosas flores

Coração materno

Disse um campônio à sua amada:
“Minha idolatrada, diga o que quer
Por ti vou matar, vou roubar
Embora tristezas me causes mulher
Provar quero eu que te quero
Venero teus olhos, teu porte, teu ser
Mas diga, tua ordem espero
Por ti não importa matar ou morrer”
E ela disse ao campônio, a brincar
“Se é verdade tua louca paixão
Parte já e pra mim vá buscar
De tua mãe, inteiro o coração”
E a correr o campônio partiu
Como um raio na estrada sumiu
E sua amada qual louca ficou
A chorar na estrada tombou

Chega à choupana o campônio
Encontra a mãezinha ajoelhada a rezar
Rasga-lhe o peito o demônio
Tombando a velhinha aos pés do altar
Tira do peito sangrando
Da velha mãezinha o pobre coração
E volta a correr proclamando
“Vitória, vitória, tem minha paixão”
Mas em meio da estrada caiu
E na queda uma perna partiu
E à distância saltou-lhe da mão
Sobre a terra o pobre coração
Nesse instante uma voz ecoou:
“Magoou-se, pobre filho meu?
Vem buscar-me filho, aqui estou,
Vem buscar-me que ainda sou teu!”

O ébrio

Nasci artista
Fui cantor
Ainda pequeno levaram-me para uma escola de canto
O meu nome, pouco a pouco, foi crescendo, crescendo
Até chegar aos píncaros da glória

Durante a minha trajetória artística tive vários amores
Todas elas juravam-me amor eterno
Mas acabavam fugindo com outros
Deixando-me a saudade e a dor
Uma noite, quando eu cantava a Tosca
Uma jovem da primeira fila atirou-me uma flor
Essa jovem veio a ser mais tarde a minha legítima esposa
Um dia, quando eu cantava A Força do Destino
Ela fugiu com outro, deixando-me uma carta, e na carta um adeus
Não pude mais cantar

Mais tarde, lembrei-me que ela, contudo
Me havia deixado um pedacinho de seu eu: A minha filha
Uma pequenina boneca de carne que eu tinha o dever de educar
Voltei novamente a cantar mas só por amor à minha filha
Eduquei-a, fez-se moça, bonita
E uma noite, quando eu cantava ainda mais uma vez A Força do Destino
Deus levou a minha filha para nunca mais voltar

Daí pra cá eu fui caindo, caindo
Passando dos teatros de alta categoria para os de mais baixa
Até que acabei por levar uma vaia cantando em pleno picadeiro de um circo
Nunca mais fui nada
Nada, não!
Hoje, porque bebo a fim de esquecer a minha desventura, chamam-me ébrio
Ébrio

Tornei-me um ébrio na bebida, busco esquecer
Aquela ingrata que eu amava e que me abandonou
Apedrejado pelas ruas vivo a sofrer
Não tenho lar e nem parentes, tudo terminou
Só nas tabernas é que encontro meu abrigo
Cada colega de infortúnio é um grande amigo
Que embora tenham, como eu, seus sofrimentos
Me aconselham e aliviam os meus tormentos
Já fui feliz e recebido com nobreza até
Nadava em ouro e tinha alcova de cetim
E a cada passo um grande amigo que depunha fé
E nos parentes… Confiava, sim!
E hoje ao ver-me na miséria, tudo vejo então
O falso lar que amava e que a chorar deixei
Cada parente, cada amigo, era um ladrão
Me abandonaram e roubaram o que amei
Falsos amigos, eu vos peço, imploro a chorar
Quando eu morrer, à minha campa nenhuma inscrição
Deixai que os vermes pouco a pouco venham terminar
Este ébrio triste, este triste coração
Quero somente que na campa em que eu repousar
Os ébrios loucos como eu venham depositar
Os seus segredos ao meu derradeiro abrigo
E suas lágrimas de dor ao peito amigo

Porta aberta

Vinha por este mundo sem um teto
Dormia as noites num banco tosco de jardim
Sem ter a proteção de um afeto
Todas as portas estavam fechadas para mim…
Mas Deus, que tudo vê e nos consola
Em seu sagrado Templo me acolheu
E, além de me ofertar aquela esmola
Meu destino transformou
Meu sofrimento acabou
E a minha vida renasceu…
Porta aberta
Tendo o emblema de uma cruz
Essa porta não se fecha
Contra ela não há queixa
São os braços de Jesus
Porta aberta
Por Jesus de Nazaré
Desvendou-me o bom caminho
Hoje é meu doce ninho
Novamente deu-me a fé
Porta aberta
Já não vivo mais ao léu
Porta aberta
Ao transpor-te entrei no céu
Porta aberta
Nunca mais hei de esquecer
Que és na terra minha luz
És o bem que me conduz
Desde o berço até morrer!