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7. Brasil recebe o mundo de braços abertos (Zeca da Casa Verde – apresentação de Plinio Marcos)

Um povo que não ame e não preserve as suas formas de expressões mais autênticas, jamais será um povo livre.

 

Você, que vem lá de outras terras

Pra viver no meu país

Seja bem vindo, pode chegar

Só que existe nova lei

Que o rei do samba, vai proclamar

Na folha vinte, no parágrafo segundo diz:

Aquele que negar e não querer sambar Vai entrar numa escola de samba Vai aprender a rebolar

E que bom que vai ser, só quero ver Todo mundo sambando pra valer Serenim, Serenim, oba! Serenim, Serenim, oba!

Olha o nosso rei na rua Sorrindo, de bom humor Dizendo que a vida precisa de alegria E com tristeza não se faz amor O povo atendeu o seu apelo Abre alas tristeza que alegria vai passar Quem vem lá de fora pra viver no meu país Tem que gostar de samba, tem que aprender a sambar

E que bom que vai ser, só quero ver Todo mundo sambando pra valer Serenim, Serenim, obá Serenim, Serenim, obá

Salve, o meu Brasil, o meu Brasil Salve, o mundo inteiro Só que agora, quem vem lá de fora Vai ter que sambar

Quem não samba vai embora

E que bom que vai ser, só quero ver Todo mundo sambando pra valer Serenim, Serenim, obá Serenim, Serenim, oba

6. Tebas “O Escravo”, Praça da Sé (Geraldo Filme – apresentação de Plinio Marcos)

Por essas e outras o Geraldão da Barra Funda foi aclamado na quadra de samba da Mocidade Alegre do bairro do Limão, por 40 escolas de samba de São Paulo e 3 de Santos como sambista imortal da Paulicéia. E um sambista imortal da Paulicéia jamais poderia esquecer do marco zero da cidade, a velha Sé! Tira teima dos sambistas de São Paulo.

 

Tebas, negro escravo
Profissão: Alvenaria
Construiu a velha Sé
Em troca pela carta de alforria
Trinta mil cruzados que lhe deu padre Justino
Tornou seu sonho realidade
Daí surgiu a velha Sé
Que hoje é o marco zero da cidade
Exalto no cantar de minha gente
A sua lenda, seu passado, seu presente
Praça que nasceu do ideal
E braço escravo
É praça do povo
Velho relógio, encontro dos namorados
Me lembro ainda do bondinho de tostão
Engraxate batendo a lata de graxa
E camelô fazendo pregão
O tira-teima do sambista do passado
Bixiga, Barra Funda e Lava-Pés
O jogo da tiririca era formado
O ruim caía e o bom ficava de pé
No meu São Paulo, oi lelê, era moda
Vamos na Sé que hoje tem samba de roda

5. Silêncio no Bexiga (Geraldo Filme – apresentação de Plinio Marcos)

Em Pirapora, o Geraldão ganhou embaixada e o direito de entrar nas bocas mais esquisitas. Bailinho do porão do Bixiga. Onde crioulo de mais de um metro e setenta tinha que dançar dobrado em cima da mulher pra não bater com a testa na viga. Mas foi ali, que o Geraldão conheceu os bambas de samba de São Paulo. Jamburá, Nego Braço, Bitucho, Marmelada, Pé Rachado e Pato n’Água. Pato N’Água, um senhor sambista.

Pato N’Água dançava samba na aba do chapéu. O Pato n’Água ficava em cima do Viaduto do Chá apitando samba e comandava a Escola de Samba Vai-Vai desfilando todinha pelo vale. O Pato n’Água era chefe da torcida uniformizada do Corinthians. Mas não foi de desgosto que o Pato n’Água morreu, não.

Pato N’Água foi levar uma cabrocha lá em Suzano Paulista e amanheceu boiando numa lagoa. Tava comido de peixe e de bala. Como foi, como não foi ninguém sabe. Defunto não fala. O que a gente sabe é que a noticia chegou no Bexiga na hora da Ave Maria e ali, nas quebradas do mundaréu, o povo inteiro chorou. E o Geraldão, legítimo poeta do povo chorou por todos nós.

Silêncio o sambista está dormindo
Ele foi mas foi sorrindo
A notícia chegou quando anoiteceu
Escolas eu peço o silêncio de um minuto
O Bexiga está de luto
O apito de Pato n’água emudeceu (2x)

Partiu não tem placa de bronze não fica na história
Sambista de rua morre sem glória
Depois de tanta alegria que ele nos deu
Assim, um fato repete de novo
Sambista de rua, artista do povo
E é mais um que foi sem dizer adeus.

4. Tradições e festas de Pirapora (Geraldo Filme – apresentação Plinio Marcos)

Aí o pessoal saiu do Largo da Banana, que não tinha mais, e foram parar lá na Rua Aimoré, na rua das tabocas. Alí naquele pedaço maldito, que quando chegava agosto o mulheril fazia uma caravana e iam tudo para Pirapora. Iam levar cachaça para o Bom Jesus de Pirapora beber. E onde vai mulher, vai vagau. E o Geraldão ia atrás. Lá em Pirapora era assim. De dia coisas com o Santo, todo mundo rezando, todo mundo agradecendo os milagres do ano, todo mundo pagando promessa, todo mundo seguindo procissão. De noite festa de gente, festa no barracão, muita cachaça, muito samba e foi aí que o Geraldão aprendeu e ganhou as divisas de grande sambista, a valentia, porque em Pirapora o mais bobo fazia e acontecia. Tinha um tal de João Diogo que só tinha uma perna e jogava capoeira! Se apoiava na muleta e dava com a outra: Tome!

E aí em Pirapora era assim:

Pirapora, ê! Pirapora, ê!
Bate o bumbo nêgo
Quero ouvir o boi gemer

À margem do lendário Tietê
Uma nova cidade surgiu
De toda parte vinha romaria
Festejar o grande dia
E cantar em seu louvor

Trazemos nesta avenida colorida
Festa do povo e costumes tradicionais
Dar ao povo o que é do povo
O que fazemos neste carnaval

Pirapora, ê! Pirapora, ê!
Bate o bumbo nêgo
Quero ouvir o boi gemer

Lá no jardim era festa de branco
A banda tocava um dobrado
As negras gritavam pregões
E as moças casadoiras procuravam namorado
No barracão a raça sambava a noite inteira
Batia zabumba, jogava rasteira
Ô, oôoô, cantando alegre a loa de um trovador
Tem branco no samba? Tem sim senhor
Ele é batuqueiro, Sandinha, ou é cantador?

Pirapora, ê! Pirapora, ê!
Bate o bumbo nêgo
Quero ouvir o boi gemer

Tiririca

O Geraldão é filho de Dona Augusta, conhecida na Barra Funda como negra da pensão. O Geraldão ia entregar as marmitas e logo ficou conhecido na Barra Funda como negrinho das marmitas. Mas bolinho de carne vinha sempre na primeira panela, por isso que ele engordou. Agora o que eu quero contar, e é o que pesa na balança, é que ele entrava na Alameda Glete para entregar marmita e ouvia samba, chegava no Jardim da Luz era só samba. Subia os Campos Elíseos, era só samba. Chegava no largo da Banana. Pouca banana e muito samba. Ali a curriola se juntava pra descarregar caminhão e, enquanto não vinha caminhão, armavam a roda do samba. Iam jogando tiririca. O Geraldão, como é que cantava o tiririca?

É tumba! moleque, Tumba!
É Tumba! p’ra derrubar
Tiririca, faca de ponta
Capoeira vai te pegar

Dona Rita do tabuleiro
Quem derrubou meu companheiro?
Dona Rita do tabuleiro
Quem derrubou meu companheiro?

Abra a roda minha gente
O batuque é diferente
Abra a roda minha gente
O batuque é diferente

1. Plinio Marcos em prosa e samba (apresentação de Plinio Marcos)

Eu conto história das quebradas do mundaréu. Lá de onde o vento encosta o lixo e as pragas botam os ovos. Falo da gente que sempre pega o pior, que come da banda podre, que mora na beira do rio e quase se afoga toda vez que chove, que só berra da geral sem nunca influir no resultado. Falo dessa gente que transa pelos estreitos, escamosos e esquisitos caminhos do roçado do bom Deus. Falo desse povão, que apesar de tudo, é generoso, apaixonado, alegre, esperançoso e crente numa existência melhor na paz de Oxalá.

Quem quiser saber meu nome, não precisa nem perguntar. Eu me chamo Plínio Marcos, sou pagodeiro do lugar.

O samba é a forma da gente minha falar dos seus mais ternos sentimentos. E é nesse embalo que eu vou. Vou contar do samba da Paulicéia e de sua gente, que é do tamanho do mundo, porque não se acanha de contar as histórias do seu pedaço de chão de terra firme. Com licença dos mais velhos, vamos de samba.

Ôôô seu Dionísio da Barra Funda, Inocêncio Mulata da Camisa Verde e Branco, Nenê da Vila Matilde, Bitucho, Marmelada, Jamburá, Sinval do Cambuci, Nego Braço, Carlão do Peruche, Bem Louco, Pé Rachado do Vai-Vai, a gloriosa alvinegra do Bexiga. Pato n’água, Vassourinha, seu Zezinho do Morro. Ôôô Dito Caipira da Unidos de Vila Maria.

A todos vocês que estão no samba desde o tempo do tamborim quadrado e do surdo do barricão. Tempo em que a polícia acabava com o pagode na base do chanfralho. Tempo que o negro pra sustentar samba na rua tinha que fazer e acontecer. A todos vocês eu peço licença.

Dona Sinhá da Barra Funda, Dona Euníce do Lavapés. Donata. Senhoras de valor provado nos desfiles da avenida. A benção tias e licença que eu vou falar do samba da Paulicéia. Ôôô Juarez da Cruz da Mocidade Alegre do Bairro do Limão, ôôô Eduardo Basílio da Rosas de Ouro da Vila Brasilândia, Ângelo do Vai-Vai, Feijoada e Chiclete do Vai-Vai também, alô Mestre Mala, irmão lá do Tatuapé, o dono do samba, alô-alô Renato Correia de Castro, alô-alô Sarmento, vocês todos que são do samba, me deem licença que eu vou falar do samba da Paulicéia. Vou contar a história de Geraldão da Barra Funda, Zeca da Casa Verde, Tuniquinho Batuqueiro. Três histórias do samba de São Paulo. Vou no balanço do samba dos batuqueiros de Santa Izabel. E vou na paz de Oxalá, que me guarda e guia.