Análise de Letras

Panis et circenses

Eu quis cantar
Minha canção iluminada de sol
Soltei os panos sobre os mastros no ar
Soltei os tigres e os leões nos quintais
Mas as pessoas na sala de jantar
São ocupadas em nascer e morrer

Mandei fazer
De puro aço luminoso um punhal
Para matar o meu amor e matei
Às cinco horas na avenida central
Mas as pessoas na sala de jantar
São ocupadas em nascer e morrer

Mandei plantar
Folhas de sonho no jardim do solar
As folhas sabem procurar pelo sol
E as raízes procurar, procurar

Mas as pessoas na sala de jantar
Essas pessoas na sala de jantar
São as pessoas da sala de jantar
Mas as pessoas na sala de jantar
São ocupadas em nascer e morrer

Comentários

Paulo Henrique Mai

20/02/2011

Vítor, tratando-se da correlação entre a música e o livro do inglês George Orwell é evidente que entre 2:00 e 2:20 minutos da música Rita Lee reproduz com a flauta sons que mais parecem sons de animais.

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Sérgio Soeiro

21/01/2011

Caro Vítor, eu não tenho nenhuma dúvida que Caetano e Gil fizeram sim, uma "chupada" na obra do George Orwel para a concepção da letra. E mais, creio que a maior inspiração recaiu nas ovelhas, que representam a alienação. E também está correta a referência à granja do Solar, do Sr. Jones. E eles dão uma bela dica do psicodelismo da época: (Mandei plantar, folhas de sonhos no jardim do solar)... As "folhas de sonhos" são as folhas da nossa velha e conhecida maconha. Obrigado e abração.

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Vítor

21/01/2011

Gostei muito da interpretação do Sérgio, mas uma coisa ficou na minha cabeça... Sempre que ouço tenho a mesma impressão de que tem alguma referência ao livro "A Revolução dos Bichos", por causa da última cena, com todos os bichos olhando os porcos e os humanos se encontrando na "sala de jantar" e não se importando com a existência deles, e também por causa dos versos "Mandei plantar/Folhas de sonho no jardim do solar" (Solar é o nome da fazenda onde eles moram)... Sei lá... pode ser apenas loucura minha, mas queria saber se alguém mais tem essa mesma impressão.

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torta

14/01/2011

sérgio soeiro, muito interessante sua interpretação.

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Paulo Cunha

28/09/2010

A grande maioria se esquece que o governo tem responsabilidade com o nossso bem estar de uma forma geral : Político, educacional, saúde e até mesmo nossa integridade física e moral...eu não gostaria de ter vivido naquela época por que concerteza teria sido ou deportado ou assassinado...Não consigo ficar calado, alienado diante de entidades governamentais ditadoras e castradoras do exercicío básico de cidadania...infelizmente "eles" ficaram impunes e até hoje ainda resquícios desse povo submisso e de um governo corrupto e oportunista dessa passividade e resignação de um povo sem identidade política, um povo que se conforma com o mínimo de dignidade, realmente, é como se viver e morrer fosse suficiente!

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helga meyer

18/07/2010

E isso ai mesmo,concordo com a interpretacao acima,alias,acho que nao tem coisa mais insana do que a gente levantar da cama somente pensando no shopping center, no tenis de marca que vai querer comprar, no carro do ano que a gente nao tem mas gostaria de ter pra '' tirar uma onda com o vizinho'', esses valores de pao e circo que mantem a gente afastado da realidade politica e social, alienacao que somente vai nos levar a um hospital triste e sujo quando envelhecermos (ou talvez nem passemos dos 60 anos de idade por causa da alimentacao pobre e do sistema de atendimento medico). Andarmos como zumbis, sem saber bem o que esta acontecendo conosco, nao enxergarmos nada alem do nariz, isso interessava aos que possuiam o poder, assim o governo podia ir deitando e rolando em cima do povo.

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Fabio Neto

06/06/2010

Poxa, excelente interpretaçao!! :-)

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Sérgio Soeiro

22/09/2009

Escrita em 1968, Panis et Circenses foi um hino do movimento tropicalista liderado por Caetano Veloso e Gilberto Gil. Mais do que um movimento de renovação artística, a Tropicália, como ficou conhecido, se manifesta como um movimento contracultural, questionando os costumes e as tradições de toda a sociedade. A irreverência e o deboche como meios para atingir os seus objetivos foram largamente criticados, tanto pela direita quanto pela esquerda, numa época marcada pela extrema politização das manifestações artísticas em geral. A música, composta por 03 estrofes e um refrão, teve como arranjador o maestro Rogério Duprat, que conseguiu criar uma salada musical com elementos de diversas escolas e épocas como o Renascentismo, o Modernismo e o Pop, bem como encontrou no estilo escrachado e modernista dos Mutantes a qualificação ideal para sua interpretação, que se tornou antológica. Panis et Circenses vem do latim e significa Pão e Circo, ou seja, a música faz uma crítica ao tipo de política adotada pelo governo militar para manter a população dócil e alienada: Entretenimento (A televisão, principalmente) e Comida (nos alimentos fornecidos pela “Aliança para o Progresso”, programa criado pelo governo americano com a intenção de angariar simpatia dos povos da América Latina). Não fugindo à característica irreverente, a obra também faz um deboche em cima dos críticos da Tropicália, e, principalmente, critica os costumes e a alienação da sociedade. No primeiro verso da primeira estrofe e no último verso da terceira estrofe os artistas se queixam da perseguição que os críticos musicais faziam ao estilo tropicalista (Eu quis cantar minha canção iluminada de sol / As folhas sabem procurar pelo sol e as raízes procurar, procurar). Os versos restantes das três estrofes são fragmentos de imagens fortes e feitas propositadamente para chocar: (Soltei os panos sobre os mastros no ar / Soltei os tigres e os leões nos quintais / Mandei fazer de puro aço luminoso um punhal / Para matar o meu amor e matei / Às cinco horas na avenida central / Mandei plantar folhas de sonho no jardim do solar). A intenção de chocar é intencional para justamente tecer a crítica que está contida no refrão ao final de cada estrofe, que é a crítica à alienação das pessoas (Mas as pessoas da sala de jantar / São ocupadas em nascer e morrer). Ou seja, a despeito do Eu-lírico mostrar estar fazendo coisas absurdas e chocantes nas ruas na intenção de chamar a atenção da sociedade para as mazelas que estavam sendo impostas pelo Status Quo vigente, aquelas pessoas o ignoravam e aceitavam passivamente o pão e o circo que o governo usava como “cala-boca”. Fechavam-se na alienação de seus mundinhos, convencidas de que tudo o que ocorria pelo afora não lhes dizia respeito. Bastava-lhes nascer e morrer.

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